PANACÉIA DELIRANTE

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Quando... (nome provisório)

Quando Mauricio começou a circular de mãos dadas com Tereza, a vizinhança quase enlouqueceu. Como se não bastasse ser quase vinte anos mais velha, ela havia sido professora de piano do rapaz até agora a pouco! Não que fosse feia, ou aparentasse mais idade, mas é que o menino era tão quieto, tão recluso, tão menino que...
- Ele só tem dezoito anos! – diziam – Nunca teve uma namorada!
- Seduzido por uma professora!
Alheios aos comentários, os dois pombinhos viviam seu romance. Ela continuava a desempenhar seu papel de professora, explicando as coisas do mundo ao amante, que escutava com paciência. Ele aprendeu a gostar de teatro, a estudar poesia, a apreciar pintura abstrata, aprendeu a diferença entre Veja e Istoé, entre romance e novela, aprendeu o que significa amar no plano físico e espiritual. Para o rapaz era como se vida se mostrasse colorida ao estalar de dedos de Tereza, como se a realidade se construísse na medida em que ela a descrevia, como que se além da fronteira da amada tudo fosse fosco, ou pior, sonho.
Numa dessas noites de calor, Tereza dormia despida sobre a cama quando Maurício puxou-lhe o lençol para analisar o corpo: na barriga, a cicatriz de uma cesariana, algumas mancha de sol na área dos ombros, poucas varizes nas pernas e, nos cabelos, resistindo à pintura, três fios brancos. Maurício nem possuía ainda barba direito, quase não tinha pelos. – Acabou de tirar o aparelho dentário! – diziam.
Tereza despertou com a brisa que vinha da janela, viu-se inteiramente nua frente a um jovem sério que parecia carregar todas as dores possíveis em seu peito.
- Que tenho eu para te dar?
- Querido?
- Porque perde seu tempo me explicando o mundo? Carrega no seu corpo tanta história, tantas que por mais que me contes jamais poderia eu lhe acompanhar. Tens uma forma tão bonita de ver a vida que me resta apenas tentar enxergá-la com teus olhos. Porque perde seu tempo me explicando o mundo?
A essa altura Mauricio já suava esperando uma resposta, na verdade esperava uma sentença. Esperava a ordem para vestir sua roupa e ir dormir o resto da noite em sua casa, esperava ter que aprender a única lição que Tereza ainda não havia lhe ensinado sobre o amor: esquecer. Mas ao invés disso, ela sentou-se tranqüila em frente ao moço. Os dois estavam nus.
- Eu não lhe explico o meu mundo, querido, eu o compartilho. O mundo é muito grande e toda essa alegria às vezes me deixa muito sozinha. Agora fecha a janela que está fazendo frio.
Adoraria poder contar como termina a história ou ao menos como terminou a noite dos dois, mas a janela foi fechada de forma que nada pude ver ou ouvir. Agente nunca sabe o que se passa por trás das fronteiras dos vizinhos...

Nenhum comentário: