PANACÉIA DELIRANTE

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Eu poderia (...)

...Eu poderia contar outras histórias, mais felizes e intensas, mas não valeriam à pena. Nós inflacionamos a felicidade. Ela está por aí, gasta, em propagandas de Campari, em outdoors de pasta de dentes, em livros, filmes, melodias e novelas das seis. Nenhuma felicidade real chega aos pés dessa que criamos. A única felicidade possível, acredito, é a promessa de felicidade. Já não há mais espaço para happy ends. Só para happy beginings. Esse é o meu...
Antônio Prata




quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Resposta


“O fracasso simplesmente nos deixa solteiros de nós mesmos, enquanto o sucesso pede que firmemos um compromisso com nós mesmos.”

Eu discordo. Para mim, no sucesso firmamos compromissos com os outros. Ninguém quer perder o sucesso. Agente diz que aprende com o fracasso, mas se pudesse morria ignorante. Se não fosse tão ingênuo, Adão jamais teria comido a maçã? Para que? 

O fracasso não... o fracasso é a ausência do outro (mesmo quando ele está lá), é a insônia que não dá trégua, fazendo perguntas e mais perguntas. Para quem?

Quem é esse “eu”, essa força controladora, muitas vezes repressora que tantas vezes se rebela de si mesmo e muda?  Muda para ser o mesmo. Muda para deixar de sê-lo. Mas quem é? Quem fez? Acho que sou atriz para não ter que responder a tais perguntas. 

Mas se tenho que ser “eu”, serei: Eu lírico. 

Por enquanto... 


domingo, 17 de outubro de 2010

Argumento



Bom, é dificil dizer, mas... Acontece, ou melhor, o que está acontecendo é que existe daquela porta para lá, um mundo de adversidades onde tudo parecerá estranho e até mesmo eu lhe parecerei confuso (a), dá porta para lá você irá se perder de mim, de ti, lá seremos outros e é provável que não gostemos.

Da porta para lá, existe um futuro incerto que, de fato, teremos que enfrentar, mas não hoje. Para o seu próprio bem, saia daí e vamos ver televisão.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Literal

E assim acaba o livro...
Notas do editor
Comentários de orelha
Não adiantam: fim da estrada.
Voltar ao começo, não resolve
O final é imutável
A conclusão é que pode ser outra... Ou não.
Mas pode valer à pena retomar a história:
Começar do início
Ou da página 34
Reler apenas aquele trecho
Esquecer o capítulo 12.
E por fim, devolvê-lo à estante,
Antes de uma próxima leitura
Ou leitora.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Feliz



Quem me lembrou dessa música foi meu pai, na praia. Ela tão belamente fala de um amor que deixa de ser, mas não deixa de estar, que preserva seu afeto intacto, pelo menos vivo:
“Trajetórias opostas, sem jamais deixar de se olhar”...


Para quem bem viveu o amor
Duas vidas que abrem
Não acabam com a luz
São pequenas estrelas
Que correm no céu
Trajetórias opostas
Sem jamais deixar de se olhar

É um carinho guardado no cofre
De um coração que voou
É um afeto deixado nas veias
De um coração que ficou
É a certeza da eterna presença
Da vida que foi
Da vida que vai
É a saudade da boa
Feliz, cantar

Que foi, foi, foi
Foi bom e pra sempre será
Mais, mais, mais
Maravilhosamente amar

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Auto-ajuda

                                                         (Pôr as barbas de molho)


Não havia razão nenhuma para ele dizer isso. Mesmo assim, disse:

- Pensar demais emburrece.

Era um senhor barbado, fedia a cigarro e tossia grave. 

- Como?

- Escute mocinha. Você é jovem e parece preocupada. Estou lhe dando um conselho para toda a vida: quando tiver que fazer uma escolha e se essa escolha não for determinante para a morte de alguém, faça uma breve consideração e entre em ação.

- Mas não é isso o que os jovens fazem?

- Não.  Eles simplesmente não pensam ou então fazem o que você está fazendo.  Imagino que no começo de sua reflexão uma voz lhe pedia para fazer uma coisa e outra dizia o contrário. Confrontando as duas possibilidades você fez ponderações para as duas alternativas...

- Claro, mas...

- Comparando as ponderações, você chegou a outras ponderações e a outras e outras. Por fim, está mais confusa do que quando começou, segmentou tanto a questão que está afogada nos pedacinhos e perdeu a noção do todo. 

Eu tentei questionar, mas o senhor não parecia escutar

- Você deve conhecer a escultura do Pensador, de Rodin: Um jovem sentado reflete e nessa ação envolve todos os seus músculos, nós observamos que todo o seu corpo se esforça para chegar a uma conclusão. No entanto, ele permanece até hoje sentado, imóvel, ponderando. Era assim que você estava quando eu cheguei.
- Não existe mal nenhum em ser cautelosa.


- Se você não quer aprender, eu não posso lhe ensinar!  Mas antes que eu vá embora, uma ultima coisa: NADA É DEFINITIVO! Mais importante que cautela é humildade. Se errar, corrige. Arrependeu-se? Volta atrás. Não dá? Paciência, as chances eram de 50% mesmo.  Quase sempre é assim... 

Após terminar o sermão, abandonou o bar. Eu realmente tinha deixado-o irritado.

Noite Severina



Corre calma Severina noite
De leve no lençol que te tateia a pele fina
Pedras sonhando pó na mina
Pedras sonhando com britadeiras

Cada ser tem sonhos a sua maneira
Cada ser tem sonhos a sua maneira

Corre alta Severina noite
No ronco da cidade uma janela assim acesa

Eu respiro seu deesejo
Chama no pavio da lamparina

Sombra no lençol que tateia a pele fina
Sombra no lençol que tateia a pele fina
Ali tão sempre perto e não me vendo
Ali sinto tua alma flutuar do corpo
Teus olhos se movendo sem se abrir
Ali tão certo e justo e só te sendo
Absinto-me de ti, mas sempre vivo
Meus olhos te movendo sem te abrir

Corre solta suassuna noite
Tocaia de animal que acompanha sua presa
Escravo da sua beleza
Daqui a pouco o dia vai querer raiar

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Depois saberás

“- Muitas vezes, o significado de determinado acontecimento só aparece muito tempo depois do acontecimento em si. A causa de algo que ocorre só acontece a posteriori. A razão disso é muito simples: todos os processos têm uma coordenada temporal (...)

(...) – Só estou dizendo que há trezentos milhões de anos teria sido uma conclusão precipitada afirmar que a vida neste planeta era absurda, ou despropositada. O que é que acontece é que a finalidade ainda não havia tido tempo de florescer (...) 

(...) – Hoje somos nós que pertencemos à vanguarda, mas não chegamos à meta. Até daqui a cem, mil ou um milhão de anos não se saberá aonde estamos indo. Dessa maneira, o que acontecerá no futuro se transforma de certo modo na causa do que acontece aqui e agora (...)”

Os trechos aqui citados são fragmentos de um conto de Jonstein Gaarder que Hebe Alves me apresentou ainda durante a graduação. O nome do texto eu desconheço. Lembrei-me dele por esses dias, depois de bater muito a cabeça na parede em derrotadas tentativas de manter minha sorte e destino sob controle. Estranhamente, as “forças do universo” pareciam resistir bravamente a qualquer iniciativa minha, de maneira que tive que me reduzir à minha insignificante situação de jovem humana mortal que tenta organizar sua bagunça interna através deste modesto diário virtual.

Derrotada por fim, veio a rendição: desliguei o motor do barco, levantei a âncora e deixei o barco correr. Obedecendo a lei da gravidade, tudo se assentou (pelo menos aparentemente), boas surpresas surgiram e fiquei mais feliz – ou menos infeliz – mais tranqüila – ou conformada...

Sejamos então otimistas e acreditemos que existe um propósito nisso tudo. Mas... Sendo assim, existe então, Deus, uma força gestora? Tudo já está escrito? O futuro existe? 

Tudo o que sei é que nesta madrugada de segunda para terça eu estou cansada e por preguiça ou bom senso cito Leminski:

“Não discuto com o destino,

 O que pintar

Eu assino.”

          

              A conseqüência (ou causa) disso eu conto depois...  

 

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Aconteceu em Ouro Preto




Era nosso último dia. O ENEARTE seria encerrado com um Ato Público: um cortejo do centro da cidade até o subúrbio, ao som do Pau e Lata, grupo do Rio Grande do Norte.  Muito calor, muita ladeira (meu deus, quantas!)  Eu queimava dentro de minha blusa de manga, mas ia – vencendo o cansaço de uma semana – ia.
Milena cumprimentava os moradores apertando-lhe as mãos, estudantes dançavam e brincavam com as crianças, alguns iam de perna-de-pau. Chegamos numa comunidade cercada de morros, de casas sobre os morros, crianças brincando, jogando de capoeira, dançando ciranda. 

Naquele momento,  no centro do universo, de baixo de um céu escandalosamente azul , vendo as meninas do meu grupo dançando, artistas como eu dançando, crianças e adultos dançando... Chorei. Meu peito transbordava felicidade com tanta violência que só me restava chorar. Entrei numa igreja próxima e aos prantos agradeci por tudo o que o teatro me proporciona: pelo Panacéia Delirante, por Ouro Preto, por Dorotéia, pela República Copo Sujo...

Já na rodoviária, chorei de novo. As meninas do Panacéia acharam que era de saudades. Mas era apenas amor e a alegria de estar amando...

Dedicado a
Milena Flick, Jane Santa Cruz, Lílith Marques e Camila Guilera -